É INDEVIDA A COBRANÇA DE IPVA APÓS ACIDENTE DE TRÂNSITO COM PERDA TOTAL DO VEÍCULO

É INDEVIDA A COBRANÇA DE IPVA APÓS ACIDENTE DE TRÂNSITO COM PERDA TOTAL DO VEÍCULO

Um contribuinte, em pleno século XXI, que sofreu acidente de trânsito com perda total e irrecuperável do veículo automotor teve que recorrer à Justiça para obter declaração de inexistência de relação jurídica tributária e anulação de cobranças de vários anos de IPVA.

A Fazenda do Estado de São Paulo tem autuado e exigido IPVA dos contribuintes que sofreram tais acidentes e deixaram de comunicar ao órgão de trânsito, ao modo e a tempo, a perda do veículo, isto é, por não terem providenciado imediatamente a baixa definitiva no Detran-SP.

Na defesa do contribuinte alegou-se que após o acidente com perda total do veículo exsurge a falta de materialidade tributária por destruição do bem, o que impede a incidência do imposto, conforme artigo 155 inciso III da Carta da República e artigo 14 da Lei 13.296 de 2008, que instituiu o IPVA no Estado de São Paulo.

A legislação estadual prescreve que em caso de furto ou roubo o imposto será restituído proporcionalmente ao período de privação do bem a contar do mês da ocorrência do fato. Por coerência e isonomia, esta regra deve ser aplicada a casos de acidente com perda total do veículo, uma vez que se trata também de caso de privação do bem.

Luciano Amaro, em sua obra principal, classifica o fato gerador do IPVA como continuado devido à característica temporal, isto é, por causa da situação material prevista na regra jurídica existir por um determinado período de tempo, embora a aferição seja realizada em dado instante (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 268-269).

Esta é a razão normativa que possibilita a restituição proporcional do tributo a partir da privação do bem.

Nesse sentido, a Juíza de Direito de Flórida Paulista, Dra. Jéssica de Paula Costa Marcelino, explicou na Sentença que “o fato gerador do imposto sobre a propriedade de veículo automotor é obviamente a existência do veículo, de sorte que, identificada com segurança a inutilização do bem, como ocorreu, desapareceu o objeto da exação, dada a perda das características necessárias para se identificar aquele bem como um veículo automotor”.

Na verdade, a exigência fiscal é um contrassenso, pois neste tipo de acidente grave é o próprio Detran-SP que declara em sistemas digitais, a partir de boletim de ocorrência policial, que o veículo fora bloqueado por sinistro de grande monta. Com rigor, na Era Digital, obrigar um contribuinte que sofreu acidente grave a recortar o número do chassis do veículo e entregar no órgão de trânsito é algo retrógrado e não altera o fato da inexistência de materialidade do tributo. A divergência de comunicação entre órgãos da mesma entidade estatal é inaceitável e não é razoável permitir a repetição desta prática fiscal no futuro. É preciso revisar as normas e melhorar os sistemas.

Nos Tribunais prevalece a ideia de que a comunicação de acidente ocorrida em processo judicial possui efeitos “ex tunc”, de modo que as cobranças de IPVA após a data do acidente acabam anuladas.

O contribuinte foi defendido pelo escritório Andrade Pinto Advocacia Tributária: Processo n. 1002207-75.2020.8.26.0673 – TJSP.

Texto atualizado em 03/06/2021.

Por Daniel Andrade Pinto, em 06/04/2021.

Daniel Andrade Pinto é advogado, mestre em Direito Constitucional pela ITE de Bauru-SP, especialista em Justiça Constitucional pela Universidade de Pisa na Itália, tributarista, diretor e editor do Tributo – Núcleo de Tributação.

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Rebeca de Lima
27 dias atrás

Tive um acidente na rodovia Dutra em 2015 e para minha surpresa o Detran protestou 3 folhas me cobrando IPva 2020/ 2022/ 2023 me lesionando e restringindo meu nome em que não consigo um financiamento e bloqueando minha habilitação…. depois de 9 anos o acidente gente? Não tenho nel mais o documento muito menos o renavam … mandei msg para a ouvidoria com fotos do carro que foi onque sobrou … sem resposta :(