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By:
- Moacyr Pinto Jr
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TRF4 suspende exigibilidade da chamada contribuição para o Funrural
A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Quarta Região deu provimento a agravo de instrumento e deferiu antecipação de tutela para suspender a exigibilidade da chamada contribuição para o Funrural.
Na decisão, a juíza federal relatora afirmou: “Desta forma, revendo posicionamento anterior, entendo indevidas as contribuições sociais incidentes sobre a receita bruta da comercialização de produtos pelo empregador rural pessoa física, em face da declaração de inconstitucionalidade da modificação do art. 25 da Lei nº 8.212/91 pelas Leis nº 8.540/92, 9.528/97 e 10.256/01.”
Decisão:
Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, nos autos de mandado de segurança, indeferiu pedido de antecipação de tutela consistente na suspensão da exigibilidade da contribuição ao FUNRURAL (eventos 23 do e-proc).
Pretende a agravante, em síntese, suspender a exigibilidade da Contribuição Social Rural (constante do art. 25 da Lei 8212/91) nos termos do art. 151, V do Código Tributário Nacional, sobretudo diante do julgamento vinculante em repercussão geral – em caso idêntico – no Supremo Tribunal Federal (RE 596.177, Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI).
É o relatório. Decido.
Apesar de já ter me pronunciado inúmeras vezes no sentido de que a Lei nº 10.256, de 10-07-2001, que deu nova redação ao art. 25 da Lei nº 8.212/91, estava arrimada na Emenda Constitucional nº 20/98 e consubstanciava-se na legislação nova, revejo meu posicionamento sobre a matéria, alinhando-me ao posicionamento do Egrégio STF.
Para melhor análise do caso, necessário um breve exame da sistemática da contribuição previdenciária sobre a produção rural.
A contribuição devida ao FUNRURAL sobre a comercialização de produtos rurais manteve-se até a edição da Lei n.º 8.213/91.
O art. 138 da citada lei expressamente extinguiu os regimes de Previdência Social que cobriam as necessidades de proteção social e atendimento assistencial da população rural pelo PRORURAL. Como este programa era custeado também pela contribuição ao FUNRURAL, à alíquota de 2% sobre o valor de comercialização dos produtos rurais (art. 15, I, da LC nº 11/71), a partir da publicação do decreto regulamentador da lei de benefícios, referida contribuição deixou de ter respaldo legal.
Desta forma, o contribuinte estava obrigado a pagar o FUNRURAL até o advento da Lei nº 8.213/91, na esteira do entendimento adotado pelas Primeira e Segunda Turmas do STJ, conforme abaixo se transcreve:
“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO CONFIGURADA. FUNRURAL. LEI Nº 7.787/89. INCIDÊNCIA SOBRE PRODUTOS RURAIS. 1. Os embargos de declaração são cabíveis quando houver no acórdão ou sentença, omissão, contrariedade ou obscuridade, nos termos do art. 535, I e II, do CPC, ou para sanar erro material. 2. A contribuição previdenciária instituída pela Lei Complementar 11/71, PRO-RURAL, foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988. 3. Com a edição da Lei 7.787/89, substitui-se a alíquota fracionada de 18,2% pela alíquota única de 20% especificando-se no artigo 3º, § 1º, que a unificação implicava a extinção do PRO-RURAL como entidade isolada a partir de 1º de setembro de 1989. 4. Entretanto, o PRO-RURAL era custeado por contribuição devida pelas empresas, sobre a folha de salários, bem como pelo produtor rural, sobre o valor comercial dos produtos rurais. Consectariamente, a lei 7.789/89 extinguiu apenas a contribuição ao PRO-RURAL relativa à folha de salários, subsistindo a contribuição sobre a comercialização dos produtos rurais (art. 15, II da LC nº 11/71). 5. Segue-se, portanto, que a extinção da contribuição sobre o valor comercial dos produtos rurais sobreviveu à Lei 7.787/89, até que veio a ser extinta, expressamente, pela Lei 8.213/91. 6. Embargos de declaração acolhidos para, sanando a omissão, dar provimento ao recurso especial interposto pela Usina Serra Grande S/A e condenar o INSS ao pagamento de honorários advocatícios à base de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, em prol da Cooperativa, ora embargante.” (STJ, EDRESP 586534/AL, Primeira Turma, Rel. Min. LUIZ FUX, j. em 10/08/2004, unânime, DJU de 25.08.2004, p. 141)
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPROVAÇÃO DA TEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL. FUNRURAL. LEI N. 7.787/89. EXTINÇÃO. LEI N. 8.213/91. PRECEDENTES. 1. Comprovada a existência de certidão de juntada do recurso especial, tem-se por satisfeito o requisito quanto à tempestividade do recurso. 2. A orientação jurisprudencial desta Corte é no sentido de que o art. 3º, inciso I, § 1º, da Lei n. 7.787/89 extinguiu apenas a contribuição do Funrural incidente sobre a folha de salários, prevista no art. 15, inciso II, da Lei Complementar n. 11/71, subsistindo a aludida contribuição sobre a comercialização de produtos rurais que, por sua vez, somente foi suprimida com a edição da Lei n. 8.213/91, em seu art. 138. 3. Agravo regimental provido.” (STJ, AGA 476898/RS, Segunda Turma, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, j. em 03/08/2004, DJU de 13.09.2004, p. 202)
A contribuição social previdenciária vulgarmente denominada NOVO FUNRURAL foi instituída pela Lei nº 8.540/92 que, em seu art. 1º, deu nova redação aos arts. 25 e 30 da Lei nº 8.212/91.
A redação original do art. 25 da Lei nº 8.212/91 previu expressamente a incidência de contribuição sobre a comercialização da produção rural; todavia submeteu somente o segurado especial a exigência.
Na redação dada pela Lei nº 8.540/92, o citado art. 25 definiu como contribuintes, tanto o empregador rural pessoa física como o segurado especial; o art. 30, ao mesmo tempo, impôs ao adquirente/consignatário/cooperativas o dever de proceder à retenção do tributo.
Assim restou estabelecido:
Art. 12:
V-
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária ou pesqueira, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua;
Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física e do segurado especial referidos, respectivamente, na alínea “a” do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada a Seguridade Social, é de:
I – 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção;
II – 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho.
1° O segurado especial de que trata este artigo, além da contribuição obrigatória referida no caput poderá contribuir, facultativamente, na forma do art. 21 desta lei.
2° A pessoa física de que trata a alínea a do inciso V do art. 12 contribui, também, obrigatoriamente, na forma do art. 21 desta lei.
3° Integram a produção, para os efeitos deste artigo, os produtos de origem animal ou vegetal, em estado natural ou submetidos a processos de beneficiamento ou industrialização rudimentar, assim compreendidos, entre outros, os processos de lavagem, limpeza, descaroçamento, pilagem, descascamento, lenhamento, pasteurização, resfriamento, secagem, fermentação, embalagem, cristalização, fundição, carvoejamento, cozimento, destilação, moagem, torrefação, bem como os subprodutos e os resíduos obtidos através desses processos.
4° Não integra a base de cálculo dessa contribuição a produção rural destinada ao plantio ou reflorestamento, nem sobre o produto animal destinado a reprodução ou criação pecuária ou granjeira e a utilização como cobaias para fins de pesquisas científicas, quando vendido pelo próprio produtor e quem a utilize diretamente com essas finalidades, e no caso de produto vegetal, por pessoa ou entidade que, registrada no Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária, se dedique ao comércio de sementes e mudas no País.
Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:
III – a empresa adquirente, consumidora ou consignatária ou a cooperativa são obrigadas a recolher a contribuição de que trata o art. 25, até o dia 2 do mês subseqüente ao da operação de venda ou consignação da produção, independentemente de estas operações terem sido realizadas diretamente com o produtor ou com intermediário pessoa física, na forma estabelecida em regulamento;
O STF, ao apreciar o Recurso Extraordinário nº 363.852/MG, em 03.02.2010, decidiu que a alteração introduzida pelo art. 1º da Lei nº 8.540/92 – que fez incidir a contribuição sobre a comercialização da produção rural – infringiu o § 4º do art. 195 da Constituição, eis que constituiu nova fonte de custeio da Previdência Social sem a observância da obrigatoriedade de lei complementar para tanto.
O RE nº 363.852/MG foi assim ementado:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PRESSUPOSTO ESPECÍFICO – VIOLÊNCIA À CONSTITUIÇÃO – ANÁLISE – CONCLUSÃO. Porque o Supremo, na análise da violência à Constituição, adota entendimento quanto à matéria de fundo do extraordinário, a conclusão a que chega deságua, conforme sempre sustentou a melhor doutrina – José Carlos Barbosa Moreira -, em provimento ou desprovimento do recurso, sendo impróprias as nomenclaturas conhecimento e não conhecimento. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – COMERCIALIZAÇÃO DE BOVINOS – PRODUTORES RURAIS PESSOAS NATURAIS – SUB-ROGAÇÃO – LEI Nº 8.212/91 – ARTIGO 195, INCISO I, DA CARTA FEDERAL – PERÍODO ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98 – UNICIDADE DE INCIDÊNCIA – EXCEÇÕES – COFINS E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – PRECEDENTE – INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR. Ante o texto constitucional, não subsiste a obrigação tributária sub-rogada do adquirente, presente a venda de bovinos por produtores rurais, pessoas naturais, prevista nos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com as redações decorrentes das Leis nº 8.540/92 e nº 9.528/97. Aplicação de leis no tempo – considerações.
Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, conheceu e deu provimento ao recurso extraordinário para desobrigar os recorrentes da retenção e do recolhimento da contribuição social ou do seu recolhimento por subrrogação sobre a “receita bruta proveniente da comercialização da produção rural” de empregadores, pessoas naturais, fornecedores de bovinos para abate, declarando a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com a redação atualizada até a Lei nº 9.528/97, até que legislação nova, arrimada na Emenda Constitucional nº 20/98, venha a instituir a contribuição, tudo na forma do pedido inicial, invertidos os ônus da sucumbência. Em seguida, o Relator apresentou petição da União no sentido de modular os efeitos da decisão, que foi rejeitada por maioria, vencida a Senhora Ministra Ellen Gracie. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, licenciado, o Senhor Ministro Celso de Mello e, neste julgamento, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa, com voto proferido na assentada anterior. Plenário, 03.02.2010. (grifei)
(RE 363852/MG, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, j. em 03/02/2010, unânime, DJe-071 de 23-04-2010)
A União interpôs embargos de declaração desta decisão, buscando obter declaração de que a Lei nº 10.256, de 2001, posterior às normas analisadas pelos ministros, teria regularizado a situação. Contudo, tais aclaratórios foram rejeitados por unanimidade pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, em 17/03/2011, acórdão ainda não publicado.
Desta forma, revendo posicionamento anterior, entendo indevidas as contribuições sociais incidentes sobre a receita bruta da comercialização de produtos pelo empregador rural pessoa física, em face da declaração de inconstitucionalidade da modificação do art. 25 da Lei nº 8.212/91 pelas Leis nº 8.540/92, 9.528/97 e 10.256/01.
Ante o exposto, com fulcro no art. 557, § 1ºA, do CPC, dou provimento ao agravo de instrumento.
Intimem-se. Oportunamente, dê-se baixa.
Fonte: Tribunal Regional Federal da Quarta Região.